Entre os meus cinco a oito anos de idade (1964-1967) era um doente crônico de asma
Vivia a base de xaropes, medicamentos e cuidados familiares para não me sujar, pois só podia tomar banho morno às cinco da manhã, caso contrário durante o dia e a noite era um gato a miar sem parar.
Após tomar o banho morno das cinco da matina, era vestido, emeiado e calçado. Não podia brincar com as crianças da rua para não me sujar. Na menor queda de temperatura tinha que me infurnar em casa enrolado em mantas.
Moravamos na época na rua Gregório de Matos no bairro da Liberdade, numa casa de calçada alta, da qual cai várias vezes por causa das minhas tranquinagens. Quantos galos tive na cabeça?!.
Para superar as crises asmáticas tomava chá de cebola acuçena, xarope de folhas (grossas) de hortelã, muitas injeções e comprimidos a base de pinicilina para superar as intermináveis crises.
Era um palito de magro. Para fortalecer tomava Biotônico Fontoura e Emulsão Scott.
Quantas noites não dormi e não deixei meus familiares ao claro.
Porém, havia os dias que eram saudáveis e sai junto com minha avós e minha irmã pelas ruas, praças e igrejas de São Luís. Numa dessas idas a às igrejas e procissões me encantei por Nossa Senhora da Conceição e São Benedito, provavelmente pela estética da estatuária dos dois Santos Católicos.
Com oito anos completos, num domingo de agosto, pelas seis horas da manhã, fui mais uma vez acometido pela asma. Dia que ia haver pelas ruas do bairro uma procissão de São Benedito e eu queria acompanhar com minha avó e minha irmã.
Meus familiares não sabiam mais o que fazer para parar com a crise asmática, já havia tomado de tudo em xarope, chá, comprimidos e injeções e nada tinha curado ao longo deses anos. Uma das soluções foi ir farmácia do seu Manoel, um farmaceutico conceituado de São Luís que possuía farmácia no bairro da Liberdade. Seu Manuel receitou uma pílula que eu deveria tomar assim que chegase em casa.
Fomos para casa, eu feliz pois poderia seguir a procissão de São Benedito, à tarde. Tomei a pílula. Depois de alguns minutos passei a ter uma crise asmática maior e a desmaiar, a sair catarros aos cantáros. Uma rede foi armada no meio da casa e um grupo de pessoas para ficar me vigiando e a orar. De tempos em tempos voltava a realidade e tentava me levantar, porém vinha uma fraqueza a cabeça rolava e a tosse imperava e a ânsia de vômito a incomodar e sair catarro, o urinol era trocado e vinha outro. Isso foi a manhã toda entrando pela tarde. Eu no meu inconsciente achava que ia morrer, o mesmo pensamento passava pela cabeça dos meus familiares e vizinhos.
Ás cinco horas da tarde, meio sonoleto, ouço as cantorias da procissão de São Benedito, vindo pras bandas do matadouro da Liberdade. Tento me reanimar mas não consigo. Comigo mesmo fico dizendo tenho que acompanhar a procissão. Consigo abrir o olho e vejo a rede rodeada de gente rezando. Levanto e digo que vou seguir a procissão do "Meu Pretinho" como carinhosamente chamava São Benedito. Mamãe diz que não tenho condições de levantar, insisto, a fraqueza volta, a cabeça rola e o vômito a sair. Caio no fundo da rede. Insisto levantar e não tenho forças, nem para abri os olhos. Ouço apenas a voz das pessoas rezando e de minha avó dizendo para mim pedir a São Benedito para eu ir pelo menos olhar a procissão dele passar.
Na rede peço a "Meu Pretinho" que quero acompanhar sua procissão até a casa onde estão fazendo a sua homenagem. Ouço minha vò pedindo a São Benedito que me cure para ir vê sua festa passando e que caso seja concedito eu iria a todas as suas procissões carregando uma vela.
A procissão já estava perto da nossa casa e eu não conseguia me levantar. Minha avó pede que eu ore pedindo a São Benedito para que eu pudesse ao menos vê-lo passar na porta de casa. Faço o pedido.
- "Meu Pretinho", não deixe que eu fique sem ver você passar e bater palmas de satisfação por amor a você.
Alguns instantes depois, consigo abrir os olhos, ter forças de levantar e subir a cabeça. Ao tentar levantar a cabeça rola quase desmaio. Vem a tosse e o vômito torrencial, me vi morrendo. O vômito vem com força como se fosse me rasgar por dentro, a cabeça por fora da rede em direção ao urinol, o chão cheio de vômito e a procissão bem pertinho. Pensei, não ver "Meu Pretinho". O vômito mais intenso, desta vez sai uma bola amarelada-esverdeada de catarro e junto a pílula. O vômito cessar. Caio exausto na rede.
As pessoas ao redor a falar, rezar e chorar:
- Esta morto!
Recobro os sentidos e levanto bruscamente:
- Morto não! Quero ver São Benedito. Ele me curou!
Cambalendo pelas mãos de mamãe (Maria de Lourdes) e minha avó (Firmina Soares), fomos para a janela da casa (os outro foram para a calçada). Da janela pude observar que já faltavam apenas duas casas para a procissão pudesse passar em frente a nossa janela. Cantavamos e davamos graças a São Benedito. Quando a imagem chegou a frente da nossa casa já estava revigorado e falante como sempre fui. Cantamos com fervor e agradecemos o milagre de São Benedito.
Após a passagem da procissão vieram limpar o chão. Encontraram o carnegão de pus e a pílula inteirinha, ela não tinha si divolvido.
A partir daí não tive mais crise asmática. Podia brincar, me lambuzar como toda criança e tomar banho a qualquer hora do dia ou da noite. Passei a ir a escola regularmente, o que não podia fazer antes. A tomar banho de chuva, ficar de roupa molhada e não me gripar.
Hoje com 52 anos tenho uma vida saudável. Raramente fico gripado ou doente de qualquer outra moléstica, a não ser as triviais do cotidiano de todo ser humano.
Até hoje caompanho a procissão de São Benedito e levo a minha vela como agradecimento.
Imagem. Renato Pereira de São Benedito. Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, São Luís/MA/Brasil.
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